27 jan Mães italianas: quem tem medo de La mamma?
No dia 13 de Dezembro passado uma esteticista de 36 anos, que chamaremos de Maria, foi para o aeroporto de Fiumicino, perto de Roma, para embarcar à Paris, onde passaria a lua de mel, junto com o marido Stefano, com quem tinha se casado apenas dois dias antes. Todavia, uma surpresa a esperava às portas do aeroporto, uma presença certamente indesejada, naquele momento tão bom de uma vida de casal: la mamma! Stefano explicou que a mãe estava sozinha e doente, não dava para deixá-la. Depois desta bizarra lua de mel a três, e depois das festas natalinas, passadas também com a sogra, Maria não agüentou mais, voltou a Napoli, onde moram os pais dela, e pediu a separação. Os advogados alegaram que a “excessiva ligação afetiva” entre o marido e a mãe dele tornava “impossível” o estabelecer-se de uma “saudável relação conjugal”. A matéria é do jornal “Repubblica”.
Imagino já quantos leitores estejam pensando: uma coisa dessas, só na Itália!
O Brasil é provavelmente o lugar melhor do mundo para ser estrangeiro; os brasileiros são acolhedores e curiosos, e muitas vezes me pedem notícias e explicações sobre a cultura ou a atualidade italiana. De fato, muitas das matérias deste Blog vêm diretamente destas conversas. Algumas perguntas são sempre as mesmas: vocês mesmo comem macarrão todo dia? Todo italiano fala alto e dança Tarantella? E (esta pergunta são as mulheres que fazem) é verdade que os homens são tão ligados a mãe?
Chegamos ao nosso assunto de hoje: la mamma. Durante as primeiras aulas do meu curso de italiano, muitas vezes chego a dizer, brincando, que mamma é a palavra mais importante da língua italiana! E o ditado talvez mais famoso no meu pais soa assim: “Di mamma ce n’è una sola!” (mamãe, só tem uma!) A primeira resposta à pergunta dos meus amigos brasileiros é, então, fácil: sim, a maioria dos homens italianos têm com a mãe uma relação toda especial, e não é coisa de hoje: escutem, no maravilhoso site de Pino Ulivi sobre a música italiana, esta gravação de 1940; o título da canção é justamente mamma, e não há na Itália quem não a conheça. Os versos centrais, do ponto de vista de uma esposa, parecem mesmo uma ameaça:
Mamma,
ma la canzone mia più bella sei tu,
sei tu la vita
e per la vita non ti lascio mai più.
Mãe,
mas a minha canção mais bela és tu,
és tu a vida
e pelo resto da vida não te deixo nunca mais.
Não podemos deixar de falar que existe nos dias de hoje, um contexto social que não favorece a emancipação dos homens italianos. O primeiro aspecto é que as mulheres na Itália trabalham muito pouco fora de casa: são apenas 50% das mulheres que trabalham, a porcentagem mais baixa na Europa; as outras se dedicam à casa e a … acudir os filhos (adultos), que por sua vez não tem muita tendência à autonomia: 47,7% dos homens italianos entre 25 e 34 anos vive com seus pais.
Este último dado é impressionante, mas a “culpa” não é apenas dos italianos “mammoni” (que amam exageradamente a mãe): hoje na Itália, infelizmente, para os jovens é incrivelmente difícil encontrar oportunidades de trabalho, as universidade não são preparadas para oferecer estágios, alugar uma casa é extremamente caro e poucas pessoas conseguem um mínimo de independência financeira antes dos 35-40 anos. Por estas e outras razões, o italiano é o povo que menos faz filhos no mundo. Apesar de ser tão amada, la mamma, poderíamos dizer, é uma espécie quase em vias de extinção. Esta é a realidade atual de um país que, ao contrario do Brasil, vive uma época de grande estagnação e de muita pouca confiança no futuro.
As coisas mudarão? Provavelmente sim: se os italianos não conseguem mais ser otimistas suficiente, primeiro para ter filhos, e depois para deixar logo que estes filhos vão à luta, longe da aconchegante proteção familiar, há na Itália quem tenha uma atitude diferente: em 2010, 20% das crianças nasceram de mães estrangeiras. A Itália do futuro falará mamma em muitas línguas diferentes. Mas disso, diremos mais em uma próxima ocasião.
Marco De Liso
italianonline